Governo e indústria móvel abrem caminho para o futuro do 5G em licitação de 2,3 GHz, 3,5 GHz e 26 GHz para serviços móveis.
O recente leilão multifaixas do Brasil, projetado para impulsionar um período de intenso investimento e incentivo à concorrência, foi um dos maiores da história mundial. O Brasil é, há bastante tempo, reconhecido por sua liderança regional e global em gestão de espectro. Graças a um bem-sucedido processo de digitalização em 700 MHz e à expansão do LTE em faixas baixas e médias, a cobertura 4G já chega a 99,1% da população brasileira.
A nova era do 5G, portanto, chegou no Brasil. O leilão, com as autorizações assinadas em 7 de dezembro, disponibilizou mais de 3,7 GHz para lances.
Houve muito interesse nas faixas de 2,3 e 3,5 GHz pelas operadoras atuais e possíveis novos entrantes, resultando em um ágio médio de 200% nos blocos regionais e quase 40% nos lotes nacionais. As operadoras nacionais receberam 40 MHz ou 50 MHz em 2,3 GHz e 100 MHz cada em 3,5 GHz. Essas larguras de faixa contígua, que seguem as melhores práticas da indústria, fornecerão uma forte plataforma de lançamento para o 5G.
Em relação à faixa de 26 GHz, diferentes estratégias foram adotadas pelas operadoras nacionais, com resultados entre 200 MHz e 600 MHz em regiões específicas. Um claro sucesso para o segundo leilão de ondas milimétricas na região e um dos primeiros a disponibilizar a faixa de 26 GHz em sua totalidade no mundo.
Políticas de incentivo ao investimento
O processo que culminou no leilão recém-finalizado concentrou-se em buscar um equilíbrio entre os objetivos do governo, as necessidades das operadoras e o bem-estar do consumidor.
Esse processo começou há alguns anos pela modernização dos instrumentos regulatórios e legais no Brasil, com o objetivo de incentivar o investimento contínuo. Em 2019, uma atualização da Lei Geral das Telecomunicações foi aprovada, incluindo três aspectos cruciais:
- Termos de autorização mais longos
- Mercado secundário de espectro
- Prorrogação sucessiva de autorizações
Tais decisões foram cruciais para apoiar as redes atuais, atrair novos entrantes e garantir melhores serviços aos usuários finais.
As regras do leilão também se concentraram no investimento de longo prazo nas redes 5G. Foram introduzidas novas condições de pagamento, incluindo parcelas anuais durante a duração das autorizações, a troca do valor do ágio por compromissos de investimento e a dedução dos custos das obrigações do preço mínimo. As condições do leilão também incluíram apoio aos objetivos das políticas públicas nacionais, como a cobertura de rodovias, proteção de serviços adjacentes, 4G em áreas remotas e um cronograma definido para a introdução do 5G.
Migração das TVROs para a Banda Ku
Outro aspecto do planejamento de longo prazo considerou o serviço de TVRO. Tal serviço é utilizado em determinados países ao redor do mundo, incluindo na América Latina e no Sudeste Asiático, como uma aplicação oportunista nas faixas de serviço fixo por satélite (FSS).
No Brasil, esse serviço tem usado espectro em 3.5 GHz, principal faixa de lançamento do 5G – já presente na maioria das redes comerciais 5G em todo o mundo e detentora do maior ecossistema de dispositivos atualmente disponível. Como tal, é uma faixa crucial para 5G e, portanto, uma solução para as TVROs foi necessária.
Considerações iniciais buscaram a continuidade do serviço de TVRO em 3,6 GHz ou a sua migração para 3,8 GHz. Para isso, Anatel, radiodifusoras, operadoras e fornecedores trabalharam para desenvolver um filtro para LNB com desempenho superior aos dispositivos disponíveis comercialmente. O modelo foi finalizado, é 100% eficaz e agora está disponível no mercado internacional.
No entanto, à medida que as necessidades de espectro em faixas médias para o 5G tornaram-se mais claras durante o processo, e após cuidadosa consideração de toda a indústria, a decisão tomou outro caminho. O Brasil decidiu que o serviço de TVRO seria migrado para a Banda Ku. Essa abordagem traz diversos benefícios, além de criar um caminho para a disponibilidade futura da faixa 3,8-4,2 GHz para o 5G.
Historicamente, os serviços de satélite nas Bandas Ku e Ka eram reconhecidos como mais suscetíveis à chuva e o Brasil, que tem longos períodos de chuva, foi um forte defensor dos serviços de satélite na Banda C. O movimento brasileiro segue uma tendência global do uso de faixas mais altas para serviços satelitais e mostra que a indústria desenvolveu técnicas avançadas de modulação por satélite, diminuindo sua dependência da Banda C. A prestação de serviços em faixas mais altas sem problemas de atenuação por chuva está se tornando um padrão global.
Lições para serem seguidas
Uma pesquisa da Coleago Consulting sobre as necessidades globais de espectro 5G em faixas médias mostrou que uma consideração cuidadosa da demanda de espectro 5G no período de 2025 a 2030 é crucial. A pesquisa sugere que os reguladores disponibilizem 2 GHz de espectro em faixas médias para o desenvolvimento do 5G, incluindo para FWA. O Brasil está dando os primeiros passos para disponibilizar essa capacidade e, com a migração das TVROs para a Banda Ku, tem potencial para ir mais longe no futuro.
Vários aspectos do processo brasileiro podem ser apontados como melhores práticas, incluindo:
- Cooperação entre reguladores, operadoras, fornecedores, radiodifusores, academia e outras partes interessadas
- Autorizações nacionais por 20 anos, com presunção de prorrogações ilimitadas, e um mercado secundário de espectro
- Espectro disponibilizado assim que possível, com 400 MHz em 3,5 GHz
- Condições de pagamento que incentivam investimentos de longo prazo
- Estudos sobre a proteção das TVROs, levando à migração para a Banda Ku. O desenvolvimento do filtro LNB de alto desempenho pode ser replicado em países onde a migração para a Banda Ku não seja possível
- Planejamento de longo prazo – migração de serviços legados abrindo caminho para o 5G na faixa de 3,8-4,2 GHz
O 5G já é realidade e países como o Brasil podem servir de inspiração. No atípico cenário atual, a disponibilização de espectro pode beneficiar, ainda mais, toda a sociedade a curto e a longo prazos. Este leilão multifaixa mostrou que o Brasil está no caminho certo para garantir que seus cidadãos estejam prontos para usufruir dos mais diversos benefícios do futuro dos serviços móveis.